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VAMOS PARA NOTÍCIA!
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Claro que a fome jamais será notícia boa, mas a empatia e a solidariedade sempre serão! Nesta crise sem precedentes, alunos carentes estão conseguindo levar escondido para casa a merenda servida nas escolas públicas. E fazem isso com a ajuda de profissionais de educação. Eles explicam que, apesar de ser proibido, estão liberando a comida por uma “razão humanitária”.
São profissionais ajudando famílias que vivem em situação de pobreza extrema, de vulnerabilidade, para que essas pessoas tenham uma refeição diária garantida durante esse período de crise financeira e desemprego. Para algumas famílias abraçadas pelos educadores, o alimento que chega da escola é o único sustento que pais e filhos terão naquele dia.
“A gente faz o que não pode fazer: chama as crianças fora do horário e dá merenda para elas levarem para casa. Às vezes, a própria família vem aqui pedir comida, como uma mãe que me disse: ‘o desespero me fez perder a vergonha — estou com fome’“, contou, Maria* – nome fictício – diretora de uma escola pública em São Paulo.
Ela explicou que a realidade é, muitas vezes difícil de ser encarada e que vai muito além das letras da lei e das normas.
Para a liberação da merenda, os profissionais criaram uma verdadeira rede de apoio formada por merendeiras, professores, coordenadores e diretores pedagógicos. Eles detectam os casos mais críticos de famílias com insegurança alimentar e traçam uma estratégia pontual para ajudar.
Causa justa
Especialistas dizem que permitir que as merendas sejam consumidas pelas famílias é, em tese, uma prática irregular, porque o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) é voltado exclusivamente à nutrição dos estudantes.
Caso essa ajuda seja descoberta, a Secretaria de Educação, em teoria, pode ser responsabilizada pelos órgãos de controle por desviar recursos públicos para algo que não está entre as finalidades do PNAE.
A diretora Maria* conta que já vivenciou situações “de partir do coração”.
“Se alguém da cozinha vê uma criança pegando muita fruta e escondendo na mochila, a gente já sabe o que está acontecendo. No fim do dia, chama os pais e dá um pouco de comida”, contou.
“Uma vez, um menino pegou tanta bolacha e guardou [na bolsa], que tivemos de chamá-lo na saída, discretamente. Explicamos que ele podia levar tudo para casa, mas que, quando precisasse, poderia pedir. Ele saiu pulando de alegria. Depois, montamos uma campanha de arrecadação”, revelou.
“É claro que é complicado: os profissionais ouvem, em uma roda de conversa na sala de aula, que alguém está passando necessidade em casa, e aí querem resolver. Mas a merenda precisa ser consumida só pelos alunos matriculados, não existe autorização para os pais consumirem”, explica Marcia Simões, presidente do Conselho de Alimentação Escolar de São Paulo.
“É uma verba que vem da Educação, para que as crianças se alimentem e tenham condição de aprender.”
Questão humanitária
Gabriel Corrêa, gerente de políticas educacionais da ONG Todos Pela Educação, também reforça que a distribuição de merenda para os familiares não é permitida, mas faz uma ressalva: “É uma questão humanitária. Os educadores tentam achar uma solução temporária e imediata para apoiar as crianças. Quem trabalha na educação sabe: aluno não aprende nada de barriga vazia”, lembrou.
O que deveria acontecer, segundo Márcia e Gabriel, é uma articulação maior das redes de ensino com o setor de assistência social.
Além disso, é importante ter um protocolo a ser seguido pelos professores quando detectarem casos de insegurança alimentar.
Único alimento
Isadora*, mãe de dois alunos de uma escola municipal, conta que está desempregada e que a única fonte de renda da família é o Auxílio Brasil (R$ 400), insuficiente para arcar com a alimentação de todos.
‘Minha filha traz a merenda para a gente jantar e almoçar”, disse a mãe.
“Foi isso que me sustentos nos últimos dois meses”
“A diretora de onde minha filha estuda é um anjo. Ela sabe quem está passando necessidade, e aí deixa a criança levar um pouco de merenda na mochila. Foi isso que me sustentou nos últimos dois meses. Graças a ela, tive almoço e jantar: mingau, canja, bolacha com suco.”
Hoje Isadora diz que as prioridades dela são garantir a comida das crianças e evitar que elas abandonem a escola para trabalhar.
“As pessoas veem meu menino como um Zé Ninguém. Ele chora e diz: ‘mamãe, um dia eu vou sair dessa vida’. Eu digo que sim, que é só estudar.”
Colégio doa arroz e feijão
Em outro colégio público, no Sudeste, a professora Lúcia* conta que “acaba sobrando alimento em dia sem aluno, como quando tem conselho de classe ou evento na escola”.
“Nessas datas, o colégio chama extraoficialmente os pais dos jovens mais carentes para distribuir feijão, ovos, verduras, frutas e, às vezes, carne. É tudo bem escondidão e por baixo dos panos, porque, se o governo desconfiar, a gestão escolar pode ser advertida”, relata.
Segundo os professores, a ação humanitária não pode parar até que todas as famílias tenham um apoio maior do governo e consigam manter pelo menos o básico de alimentação.